INTRODUÇÃO
Vale ressaltar que até o momento que estou escrevendo isto ainda falta assistir vários episódios do programa Chespirito, desenho do Chapolin, Chaves animado, séries pararelas. E também terminar de ler livros (os que foram publicados no Brasil).
Portanto conforme eu for concluindo o material pendente, posso ir atualizando.
E é claro essa é uma visão minha, análise minha, portanto não é uma verdade universal e nem igual para todos.
ANÁLISE - OBRAS EM GERAL
Chespirito era roteirista e contador de histórias. Então seus episódios eram isso, uma história com começo, meio e fim.
Mas não de qualquer jeito.
O roteiro flui. Ele não utiliza aqueles efeitos de transição (quando acontece uma cena aí aparece um efeito na tela e já muda para outro ambiente). Bom, uma vez ou outra tem, mas é irrelevante.
Usar efeitos de transição faz parecer que o capítulo é dividido por capítulos. Sem os efeitos torna tudo mais dinâmico e coeso.
A história ali gira, cada personagem encerra seu quadro, e a válvula para isso é sempre alguém sair ou entrar em cena, seja de uma casa, da rua, ou do outro pátio.
Também, além dos personagens, a história segue e muitas vezes vemos algo que acontece no início voltando no meio ou fim do episódio, conectando. Um exemplo disso é o episódio do Chapolin, do bandido Luva Negra.
Nele há uma fala "ele está armado e parapetado", daí acontece várias coisas no episódio, (inclusive Chapolin "tomar" tiros), que nos faz esquecer e aí vem a frase do Chapolin como último pedido querendo saber o significado de parapetado.
O quadro dos "Los Chifladitos" (Pancada Bonaparte). Dois malucos conversando, coisas bem viajadas, e adivinha? Fazia sentido. Todo aquele contexto sem noção tinha segmento com começo meio e fim.
E o programa não é um programa infantil, apesar de no Brasil, na época, qualquer coisa semelhante era classificado assim. O programa era feito para a família. Haviam piadas simples, bobas, de duplo sentido, história, gestos (muitos deles circenses), etc.
Os roteiros possuem humor leve, não fazem inimigos. Engloba a todos. Vale lembrar que você só ri de uma piada quando a entende ou seja, você viveu aquilo, ou faz parte daquele grupo, ou parte daquele tempo. Ou seja, se você não faz parte de algo você não entende a piada, ou, se entender, ela não faz o mesmo efeito em você, justamente por não fazer parte daquele grupo da piada.
E as piadas de Chespirito são assim, atemporais e universais. De modo que qualquer pessoa de diversas classe, cultura, tempo ou lugar, as compreenda.
Claro, isso de acordo com aquela época. Hoje sim temos uma grande distância devido a tanta tecnologia e mudança de hábitos. Mas pelo menos até o início dos anos 2000 quem nunca se identificou com alguma cena, piada ou personagem de Chespirito?!
Ele também trabalha temas sérios como a fome, o abandono e a pobreza. Mas nada disso de forma panfletária. Retrata os personagens e os temas de forma cômica.
Por ser feito para família, seus programas nunca foram com intenção de educar (ainda que tenhamos alguns ensinamentos), sempre foi de nos fazer rir, com seu humor leve, de fácil entendimento e simples.
Por isso, que quando algo é feito de forma natural, sem pretensão de tal, gravamos melhor. Por exemplo diversos desenhos ou programas COM INTENÇÃO de educar as crianças ou de nos ensinar algo se torna chato, monótono, cansativo e logo o esquecemos. MAS nunca vamos esquecer um ensinamento do tipo "a vingança nunca é plena mata a alma e a envenena", porque foi sem intenção de nos ensinar e de nos educar. Foi natural.
Outro ponto: "O estilo Chespirito é muito pesado. Muito bullyng, violência e maus exemplos"
Eu não discordo disso. No roteiro de Chespirito nós temos uns zoando os defeitos dos outros (magro, gordo, alto, baixo, velho, bochecha, etc). Temos também atores fumando. Temos muita pancada, violência corre solta. E também muitas armas. Tem até um episódio que Seu Madruga mata um gato com uma espada, enquanto o gato gritava (pra mim esse foi o mais pesado). Temos até episódio que tem sangue.
Hoje isso não seria permitido, mas devemos levar em consideração a época que foi feita. Nela isso era comum, tanto que se passar hoje em dia, ninguém questiona.
Naquela época tínhamos esses elementos em diversas outras obras. Tínhamos em Chaplin, nos Três Patetas, Ultraman, Marvel, DC, entre outros.
Lembro até hoje atores da patrulha do Ultraman, fumando. Ou o Sr. Fantástico, Wolverine, Nick Fury, Coisa, e muitos outros, fumando também.
Então isso na época era comum, até porque o Roberto se preocupava muito com o público e sempre pensava em não ofender ninguém.
PROPAGANDAS
Até as propagandas são bem feitas. Tanto dos produtos de Chespirito quanto de outros. Vou citar alguns exemplos, que lembro.
Existe aquela famosa propaganda que passa nos intervalos e essa nem ligamos, mas quando são inseridas de forma sutil, subliminar e dentro do contexto da história, nós adoramos, passamos a querer e nem percebemos.
Mas nós temos diversos episódios, muitos deles clássicos, que tem propagandas. Há alguns episódios de Chaves que ele está lendo revista do Chapolin.
O episódio do "extra 14 pessoas enganadas", o do Chaves falando em inglês na fonte, do Seu Madruga sentado em frente a sua casa.
E nos episódios de Chapolin ele falava das revista do Chaves, era o inverso.
Pode reparar que juntando os episódios citados acima (e talvez até outros) nós temos:
- Chaves, mesmo sendo bem pobre, tem a revista.
- Chaves mesmo sem saber ler direito entende a revista
- Seu madruga, um adulto, tem a revista
- Kiko, com boas condições financeiras, tem a revista.
- Chaves trabalhando de jornaleiro e explicando nos mínimos detalhes o tipo de jornaleiro que é e o que vende.
Conclusão: As revista Chaves e Chapolin são acessíveis até para os mais pobres, por serem bem baratas. São de fácil entendimento. Tanto as crianças quanto os adultos gostam. E onde você acha pra comprar.
Olha o contexto de forma sutil. Tanto que muitos de nós, naquela época, queria os gibis. Isso fez com que lançassem aqui (mas eram outros, faz parte).
Aí nós temos outros né, aqueles bonecos que a Bruxa joga no caldeirão e também a criança atira por cima do muro.
Chaves usando camisa do Chapolin, com a marca do canal 8, mostrando sobre o programa e onde passa para assistirem.
Episódio do Chapolin, do Chimpandolfo, que o herói coloca uns discos dele mesmo pra tocar.
O episódio da caixa de garrafas que tem a marca da pepsi.
O de Acapulco então? Mano...
Lá nós temos a fachada do hotel que é grande, mostrando a porta giratória. O serviço descarregando as bagagens direto do carro. O quarto do Sr. Barriga mostrando toda aquela paisagem. A piscina mostrando a parte de mergulho e também a rasa, podendo ser para adultos e crianças. A comida mostrando ser boa, por falarem do restaurante no meio da piscina, mostra eles comendo (no Chapolin, o ator não emagrece por causa da comida boa). Nos lugares de lá mostra que você pode ir a praia, se reunir com família e amigos, ou um lugar mais sossegado para ler livro ou jogar xadrez.
E aquela música no final, Chespirito já havia feito ela,e aproveitou para divulgar.
Conclusão, o hotel tem de tudo, bom atendimento, boa comida, boa paisagem, lugares mais agitados e mais calmos, piscina, entre outras coisas. Servindo para todos os públicos.
Daquela época, até hoje, muita gente queria e quer ir para Acapulco.
PERSONAGENS
E os personagens, vamos falar deles um pouco.
Chespirito sempre deixou claro que nunca quis convencer o público de que eram crianças, mas sim que são adultos interpretando crianças. Talvez essa sinceridade tenha ajudado muito, porque aí compramos a série de uma forma diferente.
O segundo ponto são os atores, eles não eram qualquer um. Tinham bagagem, realmente vestiam o personagem e um completava o outro.
Por isso que quando o personagem saía nós sentíamos a falta, por mais que o que substituísse fosse bom, ainda sim não era a mesma coisa.
Podia até ser o mesmo personagem, mas com característica mudada, que já perdia um pouco a graça.
Tipo, quando o Seu Madruga saiu do elenco, e o Professor passou a substituí-lo. Muita regravação e/ou cena que cairiam bem no Seu Madruga não deu certo. E isso foi acertando depois que o Jaiminho passou a morar na vila. Mas ainda sim o Professor mudou muito.
O Nhonho que era o mais inteligente teve que ser burro após a saída do Kiko. E depois que a Pópis foi tomando o lugar do Kiko o Nhonho foi voltando as origens do personagem, de ser o mais inteligente.
A Dona Florinda deixando de ser quem é para ser a endividada do Sr. Barriga.
Pode até não se ligar no primeiro momento, mas essas mudanças afetam o subconsciente, já que estamos acostumados ao personagem ser "daquele jeito" e aí estranhamos.
Quer ver como os atores são bons e como cada personagem está enraizado em nós? A Dona Florinda.
Isso mesmo, é um exemplo. Não é difícil achar alguém que odeia a personagem. Ou é a personagem que é menos gostada de todos os fãs.
E isso é ótimo. Porque a atriz transpareceu tudo aquilo que era para transparecer da personagem Dona Florinda. Ela captou a essência da personagem, fez passar todos aqueles sentimentos da personagem (raiva, orgulho, etc).
E o "ódio" é pela atriz? Não. A Florinda interpreta diversos outros personagens em Chapolin (idosa, atriz, dona de casa, empregada, vilã, etc) e você não odeia nenhum.
E isso foi só um exemplo, todos os outros interpretam diversos personagens.
Nós podemos ter a idéia de que o grupo principal é tão coeso e se completam que quando um sai, desequilibra o cenário.
Quando a Chiquinha saiu, por uma ou meia temporada, Chaves e Kiko até que se mantiveram bem, temos vários episódios só eles. Só que ainda sim a ausência dela foi sentida e para suprir isso foi preciso criar um novo cenário, a escola, e com ele vieram outros personagens (Nhonho, Pópis, Godinez, Malicha, entre outros).
A Malicha então tentaram fazer dela uma nova Chiquiinha. A Louca da Escadaria uma Bruxa do 71. Seu Madroga e Jaiminho um Seu Madruga.
E nada convenceu. Então a importância do elenco em serem bons e dar vida aos tais personagens é ponto fundamental para o sucesso.
Ainda falando de personagens, nós achamos que sabemos tudo sobre eles, basicamente chamando eles de rasos, de simples. Mas não, eles possuem mistério, mesmo que pouco, mas possuem.
Ou talvez nem seja mistério, seja analisarmos mais afundo do que só o que está ali na nossa frente.
Chaves é o modelo de uma criança da época, ele apronta, briga, bate, apanha.
É o menino que foi abandonado e não tem aonde morar nem o que comer, mas nunca perde o otimismo, nem a bondade e nem a inocência.
Outra coisa Não da pra sabermos se chaves é burro mesmo. Ele já citou mais de uma vez que não consegue se concentrar porque sente muita fome. Então talvez ele seja inteligente, apenas não consegue se concentrar.
Diferentemente do Quico, que é burro mesmo. pois ele tem condições e não passa fome.
Seu Madruga é o falso malandro. Ele sempre quer dar uma de esperto mas acaba tropeçando em sua própria consciência. Acaba se auto-sabotando por tentar ajudar alguém.
É o cara que não quer trabalhar, mas está sempre trabalhando. É o cara que não estudou, mas incentiva a estudar.
Então seu madruga, "o malandro" é o que da bom exemplo, bons conselhos, o vizinho prestativo, pai solo, lutador (pois com toda suas adversidades sempre carrega um sorriso consigo).
A Bruxa do 71 está sempre de mal humor, a questão é, porque? Esse apelido se deve por ela ser mal humorada ou ela ficou mal humorada após ganhar esse apelido?
E inda falando sobre época, Chespirito, na maioria das vezes, retrata personagens marginalizados pela sociedade. O pobre, o órfão, a viúva, o "vagabundo", o idoso.
Lá não existem personagens bons ou ruins, heróis ou vilões. Apenas humanos. Que agem de acordo com dia-a-dia. Uma hora estão de bom humor, outra de mal-humor. Uma hora dão bons conselhos, boas atitudes, outra fazem desdém ou usam de violência. Enfiam, variam.
Podemos ver também que Chespirito pega esses personagens marginalizados e ainda sim eleva eles, indo de encontro com o que a sociedade exigia na época.
Por exemplo: "mulher dona de casa, cuidando de tudo e homem trabalhando fora e sustentando a casa. Além de que o homem manda a mulher obedece."
Por muito tempo esse foi o segmento padrão da sociedade. Daí Chespirito vem e faz o que? Muda algumas coisas.
Por exemplo, Seu madruga não manda em ninguém, basicamente nem sua filha o obedece. Ele apanha de qualquer mulher. E ele faz serviços domésticos como lavar roupas.
As mulheres lá são independentes, vivem sozinhas, se viram sozinhas. Além disso as mulheres é que chegam no homem, como vemos Dona Clotilde e Chiquinha.
Ou inversão de idades, por exemplo, nós vemos muitas vezes a Chiquinha sendo mais madura e calma que seu pai. Em contra-partida Seu Madruga tem atitudes infantis fazendo birra do tipo jogando seu chapéu no chão e pisando em cima, ou ficar imitando debochadamente outra pessoa.
Ou seja, são comportamentos não aceitáveis da sociedade na época. Tal para qual.